Trabalho & Produtividade.
A permeabilidade entre trabalho e lazer é característica da era digital. Pouco a pouco as competências, os gestos, as linguagens entre as duas esferas da vida se tornam indistintas.
Confirma-se, em linhas gerais, a tese de Jonathan Crary de que formas de ser e de agir dominariam a estrutura 24/7 (24 horas por dia, 7 dias por semana) embaralhando as atividades reservadas ao tempo e ao lugar de trabalho.
Dissipada a fronteira física, nós não sabemos mais dizer se temos ou não um tempo livre, um tempo dedicado a nós mesmos.
Escapavam da fusão entre trabalho e não-trabalho as horas de sono. Não mais.
A insônia, provocada pelas conexões Web e pelo consumo de estimulantes para se estar permanentemente plugado, agravou a erosão do que era o último período realmente livre do trabalho que nos restava.
O sono, o tempo do não-trabalho por excelência, encurtou. Nos últimos 50 anos nos países desenvolvidos o tempo médio de sono diminuiu em 1:30 hs. Nos EUA está próximo de 6 hs. por noite. Aqui no Brasil não sabemos, mas deve andar perto disto.
Sendo improvável o desenvolvimento em futuro próximo da capacidade humana de não dormir, restam aos trabalhadores duas perspectivas. Uma, pessimista, é a de se tornarem zumbis em transe, capazes unicamente de realizar tarefas mecânicas. Outra, otimista, é a de que a tecnologia torne o trabalho tão intelectualizado que se venha a necessitar cada vez menor tempo físico de dedicação.
O que parece estar em curso é a superposição (não a combinação) das duas formas.
Oxalá a ambição de dormir em lugar de trabalhar venha a prevalecer sobre a tendência atual de trabalhar mesmo dormindo.
UTILIZE E CITE A FONTE.
Crary, Jonathan (2015) 24/7 – Capitalismo tardio e os fins do sono. Trad. Joaquim Toledo Jr.; São Paulo; Cosac & Naify Philosophie Magazine; 89; Mai 2005; p. 61