Epistemologia.

Um artigo de Brian Nozek, psicólogo, professor da Universidade de Virgínia, publicado há tempos na Science vem sendo deliberadamente esquecido.
Trata-se de uma meta-análise, envolvendo a replicação de 100 investigações, conduzidas por 270 pesquisadores diferentes.
Nozek relata que apenas 36% das réplicas confirmaram os resultados das pesquisas originais.
Nada que surpreenda. Absurdos, como a análise dos efeitos da precognição; disparates, como os premiados pelo IgNobel; e simples fraudes são cada vez mais comuns nos meios acadêmicos. As notícias de falhas, improcedências e simples má-fé são recorrentes não só no campo das ciências sóciohumanas, mas também no das ciências naturais, especialmente no da farmacologia.
Este fenômeno tem várias origens. A principal é a do produtivismo descabelado: as obrigações de publicar para obter os pontinhos que mantém o emprego universitário, e de inventar o que quer que seja que possa dar algum tipo de retorno aos financiadores públicos e privados.
Menos evidente e mais arraigado, é o obscurantismo decorrente das crendices epistêmicas.
A atual orientação para o estudo de seres portadores de consciência e história via estatística generalizante contém muito de mania, de modismo e de tolice. Não difere do que ocorreu no passado com a orientação para o normativismo – a convicção de que a vida humana é regida por leis eternas -; e a orientação para o experimentalismo – a convicção da validade científica da indução a partir de casos particulares e de experimentos in vitro.
À força da acumulação de fracassos, as cegueiras epistemológicas acabam desmascaradas. Infelizmente, custam a desaparecer e deixam rastros que as fazem ressurgir. A generalização estatística, que hoje domina o cenário das “ciências” socióhumanas, tal como ocorreu com o normativismo descritivo e o experimentalismo esquemático, que vez ou outra ressuscitam macabramente, podem parecer práticas inócuas. Mas não é assim. A obediência a paradigmas decaídos (Khun) e a observância da “metafísica influente” (Eco) são custosos. Desperdiçam tempo, dinheiro, talento e, no limite, vidas.
UTILIZE E CITE A FONTE.
Eco, Umberto (1984), Viagem à irrealidade cotidiana; Rio de Janeiro; Nova Fronteira Ioannidis, John P. A. (2005). Why Most Published Research Findings Are False. PLOS. August 30, 2005. DOI: 10.1371 Khun, Thomas S. (1989). A estrutura das revoluções científicas. Tradução de Beatriz Vianna Boeira e Nelson Boeira. São Paulo. Editora Perspectiva S.A. Nozek, Brian (2015). Estimating the reproducibility of psychological science, in, Science, Vol. 349 no. 6251, 28 August 2015, DOI: 10.1126/science.aac4716 Yong, Ed (2012). Replication studies: Bad copy. Nature, Vol. 485, 17 May. [298-300]