Ética.

O termo “mercado” denomina genericamente os detentores do poder econômico, financeiro e comercial. O termo “academia” denomina os controladores do saber estabelecido. Sabemos o que ocorre com aqueles que ousam contrariar os interesses destas pequenas coletividades. Sabemos, também, que aqueles que se colocam à serviço do Príncipe não podem escapar da imoralidade. São como os mafiosos, que auferem benefícios e segurança ao ingressarem na corporação, mas que estão presos para sempre à omertà, escravos do seu compromisso.
Uma possibilidade de enfrentar a covardia servil é a denúncia simbólica da imoralidade.
Primo Levi, cientista, escritor e humanista, sobrevivente do Shoá, relata que numa ocasião se deparou com um experimento que obrigava um esquilo a caminhar em uma gaiola rotativa. Quando, exausto, o animalzinho adormecia, era arrastado e tombava pesadamente de costas, constrangido a retomar ininterruptamente o esforço na roda. O experimento versava sobre os problemas do sono. Periodicamente, amostras de sangue do esquilo eram retiradas para verificar a produção de toxinas resultantes da insônia prolongada.
Levi, mestre da insubordinação imponderável, esperou que o laboratório esvaziasse e desligou o motor. O esquilo dormiu imediatamente.
Talvez seja culpa dele que saibamos menos sobre o sono e a insônia, mas com certeza, Levi dormiu com a consciência tranquila naquela noite. Não por se ter amotinado ou pelo discurso inútil que não pronunciou, mas pela escara simbólica que seu gesto deixou na ordem dominante.
UTILIZE E CITE A FONTE.
Levi, Primo (2016). O ofício alheio. Tradução de Silvia Massimini Felix. São Paulo. UNESP