Ética.
A obsolescência programada figura dentre as imoralidades mais lucrativas que existem.
O descarte do automóvel do ano passado, a roupa nova que deixa de ser usada porque saiu de moda, a reciclagem do que ainda funciona habituam à aceitação da má qualidade e à maquiagem do arcaico.
A sociedade de consumo forçado interdita a diversidade, a inovação, o acréscimo criativo dos bens e dos serviços que a humanidade necessita ou que deseja, como a moradia digna, a roupa que não se desgasta, a Internet franqueada.
No sistema em que a vida útil de tudo é propositadamente encurtada, sufoca-se todo e qualquer sentimento de culpa pelo que inutiliza. Criam-se falsas necessidades e desejos fictícios. A simples ganância rege o descompromisso absoluto com a racionalidade.
Parasitária, a obsolescência programada se nutre da destruição do esforço humano e o despoja do seu espírito. Deprime as consciências, colocando em seu lugar intelectos conformes.
O descarte sem sentido tem origem na Roma antiga, onde os obscenae, os “cães agourentos”, se compraziam em ferir o decoro público com o esbanjamento da devassidão. À época já se considerava que o desperdício evadia o dever que se tem para com o Outro. O Outro que não é só o pobre, a criança, a mulher, o ancião. O Outro que é a humanidade, incluindo o estranho freudiano que somos e o embrião que gestamos.