Trabalho.
O trabalho de si e a transmutação do sujeito.
Na alquimia, o inquérito da Pedra Filosofal deve coincidir com a recriação da alma. Os alquimistas pensavam que a transmutação dos metais ocorreria pari passu com a do espírito.
Tinham que o trabalho é prática asséptica, em que tanto o esforço produtivo como a Obra passam para segundo plano, se considerada a transformação do sujeito que os realiza.
O contraditório consta de uma passagem da Suma contra gentios que diz que o exercício da ars (o que inclui todas as técnicas e ofícios) não conduz à felicidade, ainda que o trabalho e a felicidade sejam, de certa forma, conexos. In operatione artis não encontramos a felicidade porque o propósito do trabalho é nos servir. O processo e o produto do trabalho não podem consistir na finalidade da vida porque o ser humano é sua finalidade, e não o contrário.
A ideia desta cisão foi recordada por Foucault, quem investigou as práticas e os dispositivos da antiguidade tardia. Mostrou que os exames de consciência, os exercícios ascéticos, o aperfeiçoamento do corpo e a elevação do espírito não estão voltados para o autoconhecimento, mas para o autogoverno. Práticas que compreendeu na denominação genérica de “cuidado de si”.
O trabalhar sobre si é o afazer do sujeito que procura dar-se forma: definir-se como ente social. Daí que a estética da existência, que Foucault postulou, não se refira a resultados, mas à conduta e à autoconstrução. É como se a vida fosse uma Obra que se constrói e se aperfeiçoa até a morte.
UTILIZE E CITE A FONTE.
Agamben, Giorgio (2018). O fogo e relato: ensaios sobre a criação escrita, arte, e livros. Tradução de Andrea Saturbano e Patrícia Peterle. São Paulo. Boitempo. [p. 145 e ss.] Foucault, Michel (2014) A hermenêutica do sujeito. Tradução de Márcio Alves da Fonseca e Salma Tannus Muchail. São Paulo. Editora WMF Martins Fontes.