Perplexidades.
Vivemos uma quadra em que a humanidade se limita a agir, sem se colocar a questão dos seus atos.
O testemunho deste apocalipse – o termo grego significa simplesmente “revelação” – se deve ao filósofo Günther Anders (ou Stern), quem elaborou um paralelo entre os milenarismos dos calendários e esse – técnico-científico – de agora.
Cada milenarismo tem caraterísticas próprias. Na volta do ano mil os fenômenos de pânico, apreensão e irresponsabilidade se deram antes e depois da data fatal. No do segundo milênio, se acreditou que o mundo acabaria pelo colapso ecológico, o nonsense econômico e a maldição tecnológica, da qual foi o epígono maior o bug do ano 2.000, que despejaria sobre nós as bombas atômicas embarcadas em satélites pré-digitais da antiga URSS.
Em ambos milenarismos cronológicos o tema predominante dos discursos foi o da fuga para um futuro em que, depois da catástrofe, tudo seria novo e puro, tendo como critério da novidade e da pureza as crenças e os desejos dos arautos mesmos do apocalipse.
Já o milenarismo técnico-científico produz uma narrativa em turbilhão. As catástrofes sanitárias, ambientais, sociais e políticas se sucedem de modo recursivo. O tema dominante é o da espiral das novidades aterradoras. Ninguém espera pela pureza. Ninguém crê que seja possível fugir para um futuro melhor.